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Estes livros verdes são venenosos – e um pode estar numa prateleira perto de si

Um pigmento tóxico verde era antigamente usado para colorir um pouco de tudo, desde flores falsas a capas de livros. Agora, a conservadora de um museu está a trabalhar no rastreio destes volumes nocivos.

POR JUSTIN BROWER
PUBLICADO 3/05/2022, 11:41
Livro venenoso

Durante o século XIX, o pigmento verde-esmeralda era o último grito na moda e na decoração de interiores – apesar de conter arsénico.

As bibliotecas e coleções de livros raros geralmente incluem volumes que falam sobre veneno nas suas páginas, desde as obras mais famosas de crime e mistério às obras seminais sobre toxicologia e investigação forense. Os venenos descritos nestes livros são meras palavras numa página, mas alguns dos livros espalhados pelo mundo inteiro são literalmente venenosos.

Estes livros tóxicos, produzidos no século XIX, foram encadernados com um tecido de cores vibrantes que contém um pigmento conhecido por verde-esmeralda, que está imbuído com arsénico. Muitos destes livros passam despercebidos nas prateleiras das bibliotecas e coleções de livros. Foi este motivo que levou Melissa Tedone, diretora do laboratório de conservação de materiais bibliotecários do Museu, Jardim e Biblioteca Winterthur, em Delaware, a lançar um projeto chamado Poison Book Project para localizar e catalogar os volumes nocivos.

Até agora, a equipa já descobriu 88 livros do século XIX que contêm o chamado pigmento verde-esmeralda. Setenta estão cobertos com um papel de tons verdes vibrantes, e os restantes têm o pigmento incorporado em etiquetas de papel ou em elementos decorativos. Melissa Tedone já chegou a encontrar um livro com este pigmento à venda numa livraria local, que acabou por comprar.

Apesar de estes livros venenosos provavelmente provocarem apenas danos menores – a menos que alguém decida devorar um tomo com quase 200 anos – os livros vibrantes e sedutores não estão completamente isentos de riscos. As pessoas que os manuseiam com frequência, como os bibliotecários ou os investigadores, podem acidentalmente inalar ou ingerir partículas que contêm arsénico, cujos efeitos incluem letargia, tonturas, diarreia e cólicas estomacais. Em contacto com a pele, o arsénico pode provocar lesões e irritações. Os casos graves de envenenamento por arsénico podem dar origem a insuficiência cardíaca, doença pulmonar, disfunção neurológica e – em situações extremas – morte.

Portanto, quão comuns são estes livros verdes venenosos? “É um pouco difícil de estimar, porque o nosso conjunto de dados ainda é pequeno, mas acredito seriamente que existam milhares de livros destes pelo mundo inteiro”, diz Melissa Tedone. “Qualquer biblioteca que colecione encadernações de tecido de meados do século XIX provavelmente tem pelo menos um ou dois exemplares.”

Livros verde-esmeralda

Quando as encadernações de tecido se tornaram uma alternativa popular e acessível ao couro, as editoras começaram a lançar volumes numa variedade de cores, incluindo o verde-esmeralda.

Uma cor linda de morrer

O verde-esmeralda, também conhecido por verde-Paris, verde-Viena e verde-Schweinfurt, é o produto da combinação de acetato de cobre com trióxido de arsénico, produzindo acetoarsenito de cobre. Este pigmento tóxico foi desenvolvido comercialmente em 1814 pela Wilhelm Dye & White Lead Company em Schweinfurt, na Alemanha. E era usado em praticamente tudo, incluindo no vestuário, no papel de parede, nas flores falsas e nas tintas. Dizer que a Inglaterra vitoriana estava banhada em tons de verde-esmeralda seria um eufemismo: em 1860, o país já tinha produzido mais de 700 toneladas deste pigmento.

A toxicidade do arsénico já era conhecida naquela época, mas a cor verde vibrante era popular e barata de produzir. Os papéis de parede expeliam esta poeira verde tóxica que acabava por cobrir os alimentos e os pisos, e as roupas coloridas com este pigmento irritavam a pele e envenenavam quem as usava. Apesar dos riscos, o verde-esmeralda estava enraizado na vida vitoriana – era literalmente uma cor linda de morrer.

À medida que estes produtos tóxicos inundavam partes da Europa e dos Estados Unidos, outra invenção começava a transformar a indústria da encadernação. Os livros no início do século XIX eram criações artesanais encadernadas em couro, mas a revolução industrial rapidamente forneceu uma forma de produzir livros em massa para uma crescente população de leitores.

“Qualquer biblioteca que colecione encadernações de tecido de meados do século XIX provavelmente tem pelo menos um ou dois exemplares.”

POR MELISSA TEDONE - MUSEU, JARDIM E BIBLIOTECA WINTERTHUR

O tecido tradicional para vestuário não suporta o processo de encadernação de livros e não é resistente o suficiente para funcionar como uma capa. Na década de 1820, o editor William Pickering e o encadernador Archibald Leighton desenvolveram o primeiro processo comercialmente viável para revestir tecidos com amido, preenchendo as lacunas na tecelagem e produzindo um material resistente: a primeira encadernação de tecido.

“Foi uma mudança de paradigma”, diz Melissa Tedone. “O tecido era muito mais barato do que o couro, o que significava que se podia vender livros a preços mais baixos.” Este processo não afetou apenas a forma como as editoras operavam; também mudou a forma como os livros eram lidos. “Tornou os livros acessíveis a um grupo demográfico muito mais vasto, chegando a pessoas de todos os níveis socioeconómicos.”

Os livros com encadernações de tecido começaram a surgir na década de 1840, e o processo de criação de capas de livros tornou-se no segredo mais bem guardado do setor. “Infelizmente, isto significava muito dinheiro para as editoras, ou seja, não existem muitas evidências documentais sobre o fabrico de capas de livros”, diz Melissa Tedone.

O que sabemos é que as capas começaram de repente a assumir uma vasta gama de cores. As editoras começaram a produzir uma variedade colorida de livros com corantes, que são soluções que se ligam quimicamente à substância à qual são aplicadas, e pigmentos, que são materiais que revestem fisicamente a substância, como lama seca num vestido de domingo. Desta forma, o pigmento verde mais elegante da época já podia enfeitar as capas dos livros mais populares.

O problema dos pigmentos, porém, residia no facto de estes terem tendência para rachar e escamar com o passar do tempo.

Veneno na biblioteca

Na primavera de 2019, Melissa Tedone recebeu um pedido de um curador da galeria de Winterthur a pedir um livro da biblioteca para expor: o Rustic Adornments for Homes and Taste, publicado em 1857.

“Este livro em particular era muito bonito, tinha um verde brilhante com muitas estampagens douradas. Era visualmente impressionante, mas estava em péssimas condições”, diz Melissa Tedone. “A lombada estava a cair e a costura estava a desfazer-se, ou seja, precisava de um trabalho de conservação antes de poder ser exibido.”

Quando observou o livro ao microscópio, Melissa começou pela capa. “Havia uma secreção preta e cerosa na superfície, e eu estava a tentar retirá-la do tecido do livro com uma pena de porco-espinho. Mas depois reparei que o corante no tecido estava a escamar com muita facilidade na área onde eu estava a trabalhar.”

Para um leigo na matéria, isto pode parecer normal para um livro com 162 anos, mas para Melissa foi surpreendente. “Não parecia que o tecido estivesse tingido”, diz Melissa. “Parecia que o revestimento de amido do tecido estivava misturado com um pigmento.”

Para descobrir a identidade do misterioso pigmento verde, Melissa Tedone recorreu a Rosie Grayburn, diretora do laboratório de pesquisa e análise científica do museu Winterthur.

Rosie Grayburn começou por estudar a amostra com um espectrómetro de fluorescência de raios-x, que bombardeia o material com raios-x e mede as energias dos fotões emitidos para determinar a sua composição química. Esta técnica consegue determinar os elementos presentes na amostra, mas não a forma como estão organizados numa molécula. Outra técnica, que usa um espectrofotómetro de Raman, mede a forma como a luz de um laser interage com as moléculas alvo, deslocando a energia do laser para cima ou para baixo. Assim como cada um de nós tem a sua impressão digital única, cada molécula tem um espectro de Raman característico.

A sensibilidade destas técnicas é fundamental, mas também é igualmente importante não serem destrutivas. “Não devemos danificar as obras de arte”, diz Rosie Grayburn.

A fluorescência de raios-x revelou a presença de cobre e arsénico no pigmento verde, uma descoberta importante, e a impressão digital única da espectroscopia de Raman identificou positivamente o pigmento como sendo o infame verde-esmeralda.

Lidar com literatura venenosa

A equipa usou o laboratório de solo da Universidade de Delaware para medir a quantidade de arsénico presente na capa do livro Rustic Adornments for Homes and Taste. Os investigadores descobriram que o tecido continha uma média de 1.42 miligramas de arsénico por centímetro quadrado. Sem cuidados médicos, uma dose letal de arsénico para um adulto é de aproximadamente 100 miligramas, a massa de vários grãos de arroz.

“Quais são as implicações de ter esta quantidade de arsénico nas luvas durante o tratamento? O que significa isto para a nossa saúde e segurança?” pergunta Rosie Grayburn.

Para responder a estas questões, Melissa Tedone e Rosie Grayburn entraram em contacto com Michael Gladle, diretor do departamento de saúde e segurança ambiental da Universidade de Delaware. “O arsénico é um metal pesado e tem alguma toxicidade associada, sobretudo quando é inalado ou ingerido”, diz Michael Gladle. “Os riscos relativos a esta encadernação com pigmento verde-esmeralda dependem da frequência de exposição, e essa é a principal preocupação para aqueles que trabalham no campo da preservação.”

Michael Gladle sugere que qualquer pessoa que manuseie estes tomos deve isolar os livros e trabalhar nos mesmos em secretárias com exaustores, para controlar quaisquer partículas de arsénico. “As pessoas que têm acesso a estes livros antigos para fins de investigação devem usar luvas e usar um espaço designado para os analisar.”

Seguindo as recomendações de Michael Gladle, a biblioteca de Winterthur retirou de circulação nove livros verdes revestidos com arsénico e colocou-os em sacos de plástico de polietileno selados. Quando manuseiam ou conservam livros em estado precário, as equipas da biblioteca usam luvas de nitrilo e depois limpam as superfícies e lavam as mãos.

Esta equipa enveredou depois pela missão de encontrar mais livros, viajando 40 quilómetros para nordeste até à biblioteca mais antiga da América, a Library Company de Filadélfia. Aqui, os investigadores identificaram mais 28 livros com encadernações revestidas com o pigmento verde-esmeralda. Com uma amostra maior, a equipa descobriu que a maioria dos livros com capa verde-esmeralda que contêm arsénico foram publicados na década de 1850.

Para ajudar outras pessoas a identificar os livros revestidos com arsénico e potenciais riscos associados, a equipa projetou marcadores coloridos com imagens de capas verde-esmeralda, bem como precauções sobre formas de manuseio e segurança. A equipa enviou mais de 900 destes marcadores pelos Estados Unidos e para outros 18 países, resultando em outras seis instituições a identificarem livros com arsénico nas suas coleções.

Apesar de o pigmento verde-esmeralda tóxico à base de arsénico estar presente nos utensílios domésticos e roupas, este nunca foi proibido. Em vez disso, a sua utilização desapareceu naturalmente, quer seja devido à sua reputação tóxica ou pela cor ter simplesmente saído de moda, como aconteceu com os eletrodomésticos de cor verde abacate na década de 1970.

E a mensagem mais importante de Melissa Tedone, sem esquecer a sua faceta de conservadora, é a de que não devemos descartar os livros com veneno. “Não é preciso entrarmos em pânico e deitá-los fora”, diz Melissa. “Só queremos que as pessoas levem isto a sério.”

 

Este artigo foi publicado originalmente em inglês no site nationalgeographic.com

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